Por Beatriz Kohlenberger
Historicamente, implantou-se no país a ideia de que o acesso à justiça e a efetivação da tutela jurisdicional eram alcançados unicamente ao serem ultrapassadas todas as fases do processo judicial, até que fosse garantida a concretização da justiça. O paradigma, por sua vez, fabricou a morosidade do sistema judiciário brasileiro atual, que apresenta características de lentidão e ineficiência.
É em razão disso que se vislumbra o crescente movimento de desjudicialização no Brasil, e, a partir deste cenário, sobreveio o debate acerca da descentralização das demandas executivas.
A ideia consiste em criar dentro do sistema judiciário uma resposta aos problemas que geram ineficácia na prestação jurisdicional, através da desjudicialização das execuções cíveis.
Essa experiência de origem dos países da União Europeia, especialmente em Portugal, teria o condão de movimentar o judiciário para proporcionar eficiência e efetividade na entrega de uma tutela jurisdicional satisfatória às partes.
Foi assim que se criou o Projeto de Lei nº 6.204/2019, que visa ser uma solução para o desenvolvimento das ações de execução cíveis, buscando afrontar a lentidão presente no judiciário, traçando novos modos de praticar a jurisdição.
Para enfrentar estas situações, o PL nº 6.204/2019, de autoria da senadora Soraya Thronicke (PSL), preconiza a atribuição de parcela do poder do Estado a outro órgão de sua estrutura, fazendo-se a translação da competência do juiz para um titular de outro instituto, o tabelião de protesto, designado especificamente para essa tarefa e sujeito a todas as responsabilidades dela decorrentes.
A pretensão é que o tabelião de protestos tenha a função de agente da execução, sendo responsável pela prática de diversas atividades que hoje são desempenhadas pelo Poder Judiciário, dentre elas a verificação dos requisitos do título executivo e de eventual ocorrência de prescrição e decadência, a realização da citação do executado e a efetivação de atos expropriatórios como a penhora, além da suspensão e a extinção da execução.
Através da criação do agente de execução de títulos judiciais e extrajudiciais para atuar e resolver as demandas nos cartórios de protesto, será possível desafogar a sobrecarga dos processos no Judiciário. Os procedimentos extrajudiciais de execução tenderão a ser muito mais céleres do que as execuções judiciais.
Contudo, embora desjudicializada, a execução deve continuar sob o controle e a fiscalização dos magistrados, e as partes deverão sempre estar representadas por advogados, garantido a observância das regras processuais gerais e do processo executivo.
O procedimento executivo extrajudicial se iniciaria com a demonstração ao agente de execução do cartório de protesto competente do título devidamente protestado, tendo já decorrido o prazo para pagamento ou impugnação.
Após, verificados os pressupostos de admissibilidade e a validade do título, será procedida a citação do devedor para efetuar o pagamento no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de atos expropriatórios. Este procedimento extrajudicial se finda com a satisfação do crédito e não há óbices à autocomposição.
É garantido o princípio da ampla defesa e do contraditório através da previsão de suscitação de dúvida ou impugnação dos atos praticados pelo agente de execução, ou, ainda, por embargos à execução, que deverão ser opostos perante o juiz de direito competente.
Resta claro que para desenvolver o projeto de lei é necessária a desburocratização, com a redução das complexidades e fixação de um plano desenvolvimentista. É notório que a lentidão e a ineficiência na entrega da prestação jurisdicional geram prejuízos de ordem material aos sujeitos envolvidos na lide, que buscam acima de tudo a resolução da controvérsia em tempo razoável.
Ressalta-se, por fim, que o Projeto de Lei se encontra ainda em análise no plenário Senado Federal, aguardando inclusão para ordem do dia, desde junho deste ano. De acordo com o atual relator, senador Marcos Rogério (PL-RO): “não temos dúvidas de que a desjudicialização da execução é um caminho importantíssimo para aliviar a sobrecarga dos processos no Judiciário. Para o cidadão, o ganho é inegável. Os procedimentos extrajudiciais de execução tenderão a ser muito mais céleres do que as execuções judiciais, o que é incrivelmente melhor para os cidadãos, para a sociedade e para o mercado’’.